A Praça do Choro é Nossa 09/01 e 05/02

Celebrando a potência do choro de BH, Regional da Serra realiza série de rodas com convidados

Entre 9 de janeiro e 5 de fevereiro, projeto “A Praça do Choro é Nossa” reúne ícones da velha guarda e expoentes da nova geração em rodas que acontecem em feiras livres de BH; programação traz, ainda, oficina com o grupo paulista Regional Imperial  

Belo Horizonte é uma das maiores praças do chorinho no Brasil. Para confirmar, basta perguntar a algum boêmio, conhecedor de nossos muitos e bons bares; ou a um morador entusiasta da música brasileira; ou a conhecedores da agenda cultural belo-horizontina. A afirmação se comprovará quando um desses personagens começar a listar as várias rodas de choro atualmente espalhadas pela cidade. Primeiro gênero musical genuinamente tupiniquim, o chorinho encontra terreno fértil e afetivo em BH – e não é de hoje. Repleta de figuras simbólicas, espaços icônicos e muitas trocas, a cena do choro atravessou gerações nas últimas décadas e encontra-se a pleno vapor.

Formado por músicos contemporâneos da capital mineira, o Regional da Serra é fruto dessa história. Nascido em 2015, do encontro de músicos que “se criaram” na emblemática roda do Bar do Salomão, o grupo é hoje uma referência da nova geração do chorinho na cidade. Para celebrar a tradição e a renovação do gênero em BH, o Regional da Serra realiza, entre 9 de janeiro e 5 de fevereiro, o projeto “A Praça do Choro é Nossa”, que reúne ícones da velha guarda e jovens expoentes em rodas que acontecerão em feiras livres de várias regiões da capital mineira. O projeto é realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte.

roda que abre a programação, totalmente gratuitano dia 9 de janeiro, domingo, ocupa a Feira Bairro da Graça, no Concórdia, com a participação de nomes “das antigas” como Zé Carlos (cavaquinho) e de jovens músicos, como Marcela Nunes (flauta transversal). Na sequência à abertura, serão realizadas rodas no dia 22/01, sábado, na Praça do Cristo, no bairro Milionários, na Região do Barreiro; no dia 23/01, domingo, na Feira Venda Nova; e, no dia 30/01, domingo, na feira do Bairro Alto dos Pinheiros.

Formado por Daniel Nogueira (pandeiro), Daniel Toledo (violão sete cordas), Pablo Dias (cavaco) e Pedro Alvarez (flauta), o Regional da Serra busca, através do projeto, difundir o choro também por meio da descentralização e da inserção da música no cotidiano da população. “A ideia de realizar as rodas nas feiras livres é fazer com que o choro chegue às pessoas em situações rotineiras. É um momento em que todos estão carentes de cultura. Então, também queremos proporcionar esta fruição espontânea. De surpresa, cotidiana. E com segurança, claro”, diz o flautista Pedro Alvarez, ressaltando que a realização das rodas seguirá todos os protocolos sanitários vigentes. “Também achamos muito importante levar o choro a diferentes regiões da cidade, principalmente àquelas mais distantes da área central, que não costumam receber muitos eventos culturais”, completa.

Além de se espalharem por BH, as apresentações vão misturar músicos experientes, como Ausier Vinícius (cavaco), Rubens (pandeiro), Geraldo Magela (violão sete cordas), Zé Carlos Choairy (cavaco), e nomes da nova geração, como Juliana Perdigão (clarineta) e Claudia Sampaio (saxofone). Um dos destaques é a programação de encerramento, no dia 5 de fevereiro, com a presença do grupo paulista Regional Imperial, referência nacional da nova geração de chorões, que inclui uma oficina gratuita, direcionada para músicos interessados em aprofundar conhecimentos na linguagem do choro, e uma grande roda que irá unir os integrantes do grupo paulista, do Regional da Serra e chorões de BH e Região Metropolitana.

A última grande roda, que acontece a partir das 16h, no Baticum, contará com dois grandes nomes da velha guarda, Cícero do Acordeon e Hélio Pereira, no bandolim e no trombone. O show também terá a presença de Juliana D’ávila, na flauta, e de Acir Antão e Diza Franco, nos vocais.

Renovação e tradição do choro em BH

Quem acompanha o choro de Belo Horizonte sabe que a cidade vive um processo de renovação nos últimos anos, iniciado em 2015, com o fim da roda do Salomão. O que, inicialmente, foi um baque para os “chorões” de BH, acabou gerando um potente e natural efeito de difusão, fazendo surgir novos grupos e rodas. “Apesar de todo mundo ter vivido bons momentos no Salomão, era uma roda que não tinha muito espaço para outros músicos. Quando ela acabou, esses músicos criaram ou foram tocar em outras rodas. Umas oito rodas novas apareceram”, relembra o violonista Daniel Toledo. “Nós logo fizemos uma roda no Brasil 41, no Santa Efigênia, que na primeira noite ficou lotada. Foi incrível”, completa, destacando ainda rodas como o Choro do Jura (no bar Juramento 202, no Pompeia); o Choro da Mercearia (no Bar do Walter, no Santa Tereza); e a Roda Padreco (no Butiquim Vila Rica, no Padre Eustáquio).

O Regional da Serra, tal como se configura hoje, também deriva desse processo. “Crias” da roda do Salomão, os quatro músicos belo-horizontinos, que já tocavam juntos em alguns trabalhos profissionais, decidiram, nessa época, oficializar o grupo e batizaram-no com o bairro que os conectou. “Colocamos o nome em homenagem ao bairro onde fica o Salomão, juntando com essa coisa tradicional do choro, do ‘regional’. Geralmente, os ‘regionais’ têm violão sete cordas, violão seis cordas, pandeiro e cavaco. E tocam sem muitos improvisos. No nosso caso, só temos um sete cordas, mas nos inspiramos nos regionais mais na forma tradicional de executar as músicas e no repertório”, afirma o cavaquinista Pablo Dias.

“Acaba que os instrumentos solo ditam muito o que tocamos. Ou seja, como a flauta é nossa principal solista, temos muito Altamiro Carrilho, Pixinguinha. O cavaco também é forte, então entra bastante Waldir Azevedo. Mas não ficamos fechados à formação, fazemos muitas do Jacob do Bandolim. Uma coisa que buscamos é executar não só os clássicos dos grandes compositores, mas choros menos conhecidos, para contribuir com a difusão”, continua Dias. “Nosso repertório tem muito a ver com o choro de BH, com o que se toca na cidade, mas também com as referências de cada integrante. E já estamos nos planejando para gravar choros autorais”, completa.

Para Pedro Alvarez, a renovação do choro, do ponto de vista musical, se dá naturalmente pela transferência de conhecimento entre gerações. “O choro é um gênero antigo, por definição. Mas que segue atravessando as gerações, sendo sempre revisitado por músicos e ouvintes. Essa passagem de geração, por si só, renova a linguagem. ‘O choro é eterno’, disse o Caetano Brasil, grande clarinetista mineiro, de Juiz de Fora, que foi indicado ao Grammy Latino. Acredito que, quem chega, estuda e se inspira nos grandes mestres, aprende com a velha guarda e desenvolve uma identidade até buscar um caminho autoral”, afirma.

Para Daniel Toledo, a renovação do choro em BH não é só musical, “mas também social, de conceitos, de visões sociais e políticas”. “O choro já foi ligado a uma coisa mais conservadora, sempre masculina. Muitos músicos antigamente eram militares. Hoje, você vê espaços, músicos e público progressistas, que respeitam a diversidade, que não aceitam o preconceito, com rodas que acolhem instrumentistas mulheres, que são mais abertas musicalmente”, ressalta o violonista. Entre chorões e choronas da nova geração, os músicos do Regional da Serra citam nomes como Juliana D’ávila e Marcela Nunes (flauta), Sandra Leão e Analu Braga (pandeiro), Artur Pádua (violão seis cordas), Matheus Petrus (trompete) e João Paulo ‘Buchecha’ (trombone).

Quando o papo é velha guarda, os instrumentistas do grupo reverenciam a memória do Mozart Secundino (violão seis cordas), ícone do chorinho de BH e um dos fundadores do Clube do Choro de Belo Horizonte, falecido em 2015, aos 92 anos. “Seu Mozart é uma influência incontestável para todo mundo que toca choro na cidade. Principalmente, para quem passou pelo Bar do Salomão”, afirma o pandeirista Daniel Nogueira, destacando outros espaços que contribuíram historicamente para a solidificação da cena, como Pedacinho do Céu, Cartola Bar, Mercearia do Lili e Bar do Bolão. “Também já perdemos outros grandes nomes, como Daniel Sete Cordas, Zazá do Pandeiro, Tião do Bandolim e, mais recentemente, Marcelão, vítima de Covid, no ano passado. Mas temos a honra de dividir tempo e espaço com tantos outros, como Zé Carlos, Geraldo Magela, Zito e Ausier Vinícius. Todos estarão nas rodas que realizaremos com este projeto, o que é um presente para nós e para a cidade”.

Abertura: 09/01, domingo, na Feira Bairro da Graça (R. Itapegipe, 882-936 – Concórdia)

Próximas rodas: 22/01, na Praça do Cristo; 23/01, na Feira Venda Nova; 30/01, na feira do Alto dos Pinheiros; 05/02, no Barticum (R. Itataré, 566 – Concórdia). Todas as rodas são gratuitas.

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