Festival Tapume celebra o protagonismo do lambe-lambe – 16/10 a 18/11

Com curadoria de Bruna Alcântara, Juliana Gontijo e Tainá Evaristo, a 3ª edição do projeto, idealizado por Leonardo Beltrão, reúne dez artistas para espalhar cores e poesia pela cidade, além de ofertar oficinas gratuitas e visitas guiadas

Depois do sucesso das duas primeiras edições, o Festival Tapume volta a colorir Belo Horizonte em 2025, reafirmando a força do lambe e sua capacidade de aprofundar o diálogo com a cidade. Na 3ª edição, dez artistas de diferentes origens e tendências produzirão obras e intervenções no Circuito Baixo Centro, com atividades e exposições no Centro de Referência da Juventude (CRJ), no Edifício Sulacap e no Edifício Central, incluindo a Escola Livre de Artes – ELA, em diálogo com a Zona Cultural da Praça da Estação. O lançamento acontece em 16/10 (quinta-feira), às 18h, no Edifício Sulacap, com entrada gratuita e livre para todos os públicos.

A 3ª edição do Festival Tapume é viabilizada por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte, com patrocínio do Hospital Orizonti.

Neste ano, o festival tem o propósito de expandir fronteiras e seguir dando visibilidade a novas caras da arte urbana, fazendo dos lambes um vislumbre de novos olhares para a cidade. “Se nas duas primeiras edições ocupamos a cidade para afirmar a potência dessa linguagem, agora queremos aprofundar ainda mais. Essa 3ª edição é de continuidade, mas também de expansão: trazer novas vozes, novas camadas e reafirmar que Beagá tem lugar de destaque na cena da arte urbana”, justifica Leonardo Beltrão, idealizador do projeto.

Surgido na Europa do século XIX a partir da popularização da impressão em massa, o lambe ganhou diferentes contornos ao longo das décadas. No Brasil, se consolidou como ferramenta de enfrentamento à censura durante a ditadura civil-militar e foi transmutado como expressão poética ao longo dos anos. “O lambe é um grito colado no muro, mas também uma forma de semear delicadeza no meio do caos”, define Beltrão. “Ele acompanha o corpo social e fala de política, afetos, identidades, ancestralidade e urgências”, complementa.

Protagonismo feminino e diversidade

Em 2025, a curadoria segue uma marca registrada do Festival Tapume, que desde a primeira edição conta com curadoria 100% feminina, valorizando a produção de artistas muita vezes invisibilizados, não apenas da capital mineira, mas também do interior de Minas e de outras regiões do país. “O lambe sempre teve forte presença feminina, mas muitas vezes invisibilizada. O Tapume sempre buscou colocar esse protagonismo em evidência, com a clareza de que ainda precisamos ir muito além”, afirma Beltrão.

A curadoria, composta por Bruna Alcântara, Juliana Gontijo e Tainá Evaristo, foi responsável por selecionar um grupo de artistas diverso, com múltiplas expressões e trajetórias. “Bruna é uma das artistas mais renomadas do Brasil no lambe-lambe. Juliana e Tainá trazem olhares que se somam, atentos à cidade e à linguagem. O resultado é uma edição com diversidade estética e política”, destaca Leonardo.

Bruna Alcântara, artista visual e jornalista, tem trajetória marcada pela pesquisa sobre corpo, maternidade e política, utilizando o lambe como linguagem principal. Participou de festivais no Brasil e no exterior, como o Cheap Street Poster Art Festival (Itália) e o LambesGoia (Goiás). Juliana Gontijo, artista e pesquisadora representada pela Galeria Murilo Castro, desenvolve obras e curadorias que conectam geografia, biodiversidade e humanidades. Já Tainá Evaristo, designer, artista visual e pesquisadora da UFMG, investiga a memória negra, a visualidade decolonial e o design como campo social.

As artistas: múltiplas linguagens, uma cidade em diálogo

A partir de olhares essencialmente femininos, a terceira edição do Festival Tapume apresenta um panorama rico da produção do lambe. Line Lemos transforma a rua em quintal afetivo ao expandir sua pesquisa”Arqueologia doméstica de afetos e ruínas” para o mural urbano. A partir de registros fotográficos de quintais de sua família, a artista, que é mestre em História e Culturas Políticas pela UFMG, cria um lambe que evidencia a força poética da xilogravura e traz à luz imagens de espaços tradicionalmente íntimos e afetivos.

No painel “Erguer o Sonho”, Iaci propõe um olhar sensível sobre a maternidade e o trabalho de cuidado, que muitas vezes sobrecarrega as mulheres em relações desiguais. A obra representa corpos femininos que coexistem no ritmo urbano frenético, enquanto suas cabeças, alongadas, elevam-se em direção aos sonhos. Artista e mãe, com trajetória entre os quadrinhos, a pintura e a idealização do Movimento Arte na Maternidade (MAM), Iaci convida o público a interagir colando post-its ao redor da obra, com mensagens sobre seus desejos e sonhos.

Em outra frente de atuação, Ana Elisa Neves, artista afro-referenciada, apresenta a obra “Noturna”. Ampliada em lambe-lambe, a pintura investiga os encontros entre luz e escuridão nas paisagens mineiras e nas peles negras que as habitam. A partir de uma paleta que evoca o verde das montanhas ao cair da noite, a artista reflete sobre ancestralidade, memória e visibilidade. “O escuro da pele e o escuro do chegar da noite levaram a contemplação da cor verde e das pequenas escuridões ao redor, concebendo representações de figuras negras nessa perspectiva”, explica a artista.

No mesmo caminho, Priscila Rezende apresenta “Afluente”, uma obra que convida à contemplação das forças da natureza e do corpo como território sagrado. Inspirada por vivências no Quilombo Kalunga, na Chapada dos Veadeiros, a artista utiliza um espelho em tamanho real de seu corpo, que reflete céu, vegetação e águas correntes. “Essa obra é uma celebração poético-visual das forças e matérias que sustentam o ser, mas também um lembrete da necessidade do respeito, do cuidado e da comunhão à terra, às águas, e consequentemente, à vida”, justifica a artista, reconhecida internacionalmente por sua poética de resistência e decolonialidade, com obras expostas em países como EUA, França, Alemanha e México.

Com raízes no Sul de Minas, Bárbara Elizei traz para o festival uma imagem simbólica que representa o chamado Brasil profundo: um caminhão carregado de alimentos, ladeado pela frase direta: “se o interior não produz, a capital não come!”. Pintada originalmente em tinta óleo sobre madeira, e agora transposta para o lambe, a obra reafirma o protagonismo da agricultura familiar em Minas e no país. Formada em Artes Visuais pela UFMG, Bárbara propõe um olhar crítico sobre os fluxos territoriais e os vínculos entre paisagem, sociedade e sobrevivência.

Na obra “Memória e Fé”, Iêda Carvalho, por sua vez, evoca a ideia de lar como espaço de aconchego, pertencimento e ancestralidade. A artista, ilustradora e tatuadora natural de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, compõe uma imagem que reúne elementos cotidianos e plantas de poder e de cura, ou seja, símbolos de vitalidade e proteção, conectando culturas indígenas e afro-diaspóricas.

Com forte engajamento político, Izabela Santiago apresenta o “Manifesto árabe-latino-americano”, obra que articula lambe, stencil e spray em sobreposição de imagens e palavras. Nela, o lenço palestino keffiyah e a melancia, considerados símbolos de resistência árabe, aparecem ao lado da frase “do rio ao mar”, lema de luta contra o genocídio palestino. “É um trabalho que articula estética e política, abordando não apenas o genocídio palestino e sua replicação à formação do Brasil, mas também a diáspora árabe e as camadas de apagamento e resistência que estruturam o processo étnico brasileiro”, pontua Izabela.

Na fronteira entre arte e inclusão, Flávia Librário leva às ruas o projeto “Librário na Rua”, um jogo que divulga a Língua Brasileira de Sinais (Libras) por meio de lambe-lambes interativos. Doutora em Design pela UFMG e criadora da tecnologia social “Librário”, a artista convida o público a participar de uma oficina que transforma a cidade em espaço de aprendizagem, acessibilidade e diversidade linguística, unindo arte, design e pedagogia.

Voltadas às infâncias, Bela Righi e Thais Azevedo, dupla que compõe A Banca Crianceira e se dedica a “criançar espaços públicos”, conduzem a oficina “Desenhacidade”, uma experimentação gráfica que convida as crianças a criar narrativas visuais sobre Belo Horizonte, a partir de intervenções de desenho sobre símbolos da cidade. A proposta amplia o conceito de espaço público como território de brincadeira, imaginação e escuta, resultando em pôsteres que cada participante levará para casa, como memória da experiência.

Único homem entre os selecionados, Alisson Damasceno desenvolve uma intervenção que une lambe-lambe e stencil para representar o diálogo entre corpo, cultura e educação. Inspirado em manifestações como a capoeira e as danças urbanas, o artista, habilitado em pintura pela Escola Guignard, cria imagens que entrelaçam mobiliário escolar e movimentos corporais, propondo o espaço público como campo de aprendizado e expressão.

Programação

A visita guiada para conhecer as obras dessa edição acontecerá no dia 25/10 (sábado), às 15h, no Circuito Baixo Centro. Não é necessário realizar inscrição prévia para participar. O ponto de encontro será na portaria do Edifício Sulacap. As oficinas de lambe-lambe, a serem ministradas pelos artistas selecionados, ainda terão inscrições divulgadas em @festivaltapume.

As dez obras desta edição poderão ser vistas em diversos pontos do Circuito Baixo Centro, entre os dias 16/10 e 16/11. O Centro de Referência da Juventude, ao lado da Praça da Estação, vai abrigar os trabalhos de Iaci, Izabela Santiago e Alisson Damasceno; o Edifício Sulacap, em frente ao Viaduto Santa Tereza, recebe os murais de A Banca Cirandeira, Flávia Librário e Ana Elisa Neves; o Edifício Central será colorido pelas criações de Line Lemos e Bárbara Elizei; e a Escola Livre de Artes – ELA, localizada dentro do Edifício Central, terá murais de Priscila Rezende e Iêda Carvalho.

Na sequência, ao longo deste ano, as obras terão caráter itinerante no Circuito Transborda, ao percorrer dez Centros Culturais, em todas as regionais da cidade. Os lambes poderão ser visitados durante um mês, nos respectivos horários de funcionamento dos Centros Culturais, entre os dias 18/11 e 18/12, a partir da programação abaixo:

  • Centro Cultural Usina de Cultura (A Banca Cirandeira)
  • Centro Cultural Vila Santa Rita (Iaci)
  • Centro Cultural Vila Marçola (Iêda Carvalho)
  • Centro Cultural Venda Nova (Line Lemos)
  • Centro Cultural Salgado Filho (Bárbara Elizei)
  • Centro da Cultura Popular e Tradicional Lagoa do Nado (Alisson Damasceno)
  • Centro Cultural Padre Eustáquio (Priscila Rezende)
  • Centro Cultural Lindéia Regina (Ana Elisa Neves)
  • Centro Cultural Jardim Guanabara (Flávia Librário)
  • Centro Cultural São Geraldo (Izabela Santiago)

Sobre Leonardo Beltrão

Leonardo Beltrão é o olhar por trás do Festival Tapume, uma ideia que nasceu do encontro entre o #umlambepordia e a Através – Gestão Cultural. Gestor, produtor e escritor, atua desde 2004 no campo da cultura, com passagens por instituições como Inhotim, Sesc Palladium e Secretaria Municipal de Cultura de Belo Horizonte. À frente da Através, dirige o Festival Tapume, o Rango de Rua, o Rango y Rolé, o Comidinhas de Estrada e tudo mais que der vontade de botar na rua. É autor de dois livros, entre eles #UmLambePorDia – Poemas de Muro e Amor, uma coletânea de 120 lambe-lambes impressos em tipografia e espalhados por aí.

Festival Tapume 2025

Abertura da programação oficial da 3ª edição

Quando. 16/10/25 (quinta-feira), às 18h

Onde. Edifício Sulacap (Avenida Afonso Pena, 981, Centro)

Quanto. Todas as atividades são gratuitas

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