42º volume da coleção reflete sobre a trajetória do Zoológico de BH, de espaço de entretenimento a instituição de pesquisa e conservação da vida silvestre; historiadora Regina Horta Duarte lança o livro neste sábado, 13/12, às 11h, na Livraria Jenipapo
Com 66 anos de história e instalado no coração da Pampulha, numa área de transição entre os biomas do Cerrado e da Mata Atlântica, o Zoológico de Belo Horizonte tem ocupado, desde sua fundação, em 1959, um lugar importante no cotidiano da população, marcado por histórias curiosas e episódios emblemáticos, como a fuga da onça-pintada em meados de 1970 — caso que mobilizou jornais da época e causou sensação na cidade. Ao mesmo tempo, atravessou transformações profundas ao longo das décadas, que o levaram de um lugar de lazer popular em torno do “exótico” a um centro de medicina veterinária, pesquisa acadêmica, conservação e educação ambiental voltada para o cuidado com a vida silvestre.
É essa travessia histórica e afetiva que a historiadora Regina Horta Duarte, especialista em história dos animais, destrincha no livro “Zoológico”, o 42º título da coleção “BH. A Cidade de Cada Um”. O lançamento acontece neste sábado (13/12), das 11h às 14h, na Livraria Jenipapo. O livro foi viabilizado com o patrocínio da empresa Tecnokor, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura do Ministério da Cultura.
Dividido em quatro capítulos, o livro costura a memória pessoal da autora com uma ampla investigação documental. Regina cresceu frequentando o Zoológico com o pai, Manoel, hoje com 98 anos, em visitas de infância preenchidas por encantamento, mas também por sensações que ela ainda não conseguia nomear e distinguir.
“Minha lembrança infantil mais forte do zoológico é a de um passeio alegre ao lado do meu pai. Ali, foi aguçada minha sensibilidade e curiosidade em relação aos animais. Não me lembro de sentir incômodo pelas más condições então predominantes. Mas me recordo do mau cheiro que invadia minhas narinas quando me aproximava das jaulas, e hoje penso como o zoológico deveria ser, naquele tempo, um local insalubre”, relata. Décadas depois, já pesquisadora experiente, voltou ao mesmo espaço para redescobri-lo sob novas lentes.
Novos olhares para a vida silvestre
A motivação do livro nasceu, em grande parte, da forma como uma parcela da sociedade passou a reagir aos zoológicos, com preconceito e julgamentos muito assertivos. “As pessoas se deixam levar por emoções e apelos e, em certa medida, por falta de informações. Vou dar um exemplo: em determinada época do ano, a vegetação do Zoológico fica mais seca, porque essa é a característica do Cerrado, bioma no qual ele foi construído, e não uma consequência da falta de cuidado, como muitas pessoas pensam, chegado até a reclamar com os funcionários, conta Regina.
Atualmente, o Zoológico de Belo Horizonte ocupa uma área de aproximadamente 1,4 milhão de metros quadrados, abrigando mais de 3 mil animais de cerca de 250 espécies, entre mamíferos, répteis, aves, peixes e anfíbios, além de manter setores especializados para o manejo e a preservação de espécies vegetais nativas e exóticas.“Existem padrões e protocolos rígidos, certificações nacionais e internacionais, biólogos com décadas de experiência, tratadores que amam aqueles animais. Durante a pandemia, essas pessoas continuaram a trabalhar lá todos os dias, e a cuidar dos animais, e disso poucos se lembram”, relata a historiadora.
Cuidados e rotinas
Neste contexto, o livro aproxima o leitor de rotinas em torno dos animais pouco conhecidas, como a preparação cuidadosa das dietas por funcionários, o acompanhamento diário de gorilas, répteis, aves, lobos-guará e elefantes; a pesquisa desenvolvida por veterinários e biólogos do zoológico e da Escola de Veterinária da UFMG; e o recebimento de animais resgatados do tráfico, muitos deles impossibilitados de retorno imediato à natureza, e que recebem os primeiros cuidados no hospital veterinário do Zoológico.
Além de memórias e resgates históricos, a publicação revela, a partir do olhar cuidadoso da autora, cenas singulares observadas em suas visitas e nos documentos: gorilas que interagem com tratadores em laços afetivos, aves que demonstram vínculos com seus cuidadores, e felinos que se beneficiam com atividades de enriquecimento ambiental desenhadas especialmente para estimular comportamentos naturais.
“Como historiadora, o que mais me fascinou foi descobrir o Zoológico como lugar de pesquisa. Essa é uma instituição parceira para ações de conservação frente à destruição da vida silvestre. Então, estamos falando de um lugar que convida as pessoas a conhecerem melhor a vida silvestre e agirem de forma mais efetiva em sua defesa”, afirma.
Ao longo da pesquisa, a autora explorou acervos do próprio Zoológico e do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, incluindo fitas VHS em processo de digitalização, além de fotos e documentos diversos, buscando reconstruir episódios marcantes e políticas públicas importantes, como o surgimento da Fundação ZooBotânica, em 1991 — extinta em 2017, quando um decreto municipal subordinou a instituição à Fundação de Parques Municipais e ZooBotânica, que engloba também 80 parques, e quatro cemitérios da cidade.
Regina destaca ainda o papel do Zoológico na educação ambiental, um trabalho dirigido a crianças, adolescentes, idosos, estudantes com deficiência visual e alunos de escolas públicas há décadas. “O Zoológico historicamente é um lugar que atrai as crianças, une as famílias. E foi se transformando com o tempo. É claro que a instituição demanda muitos investimentos, mas inegavelmente precisa ser defendido como um patrimônio da cidade de Belo Horizonte, e como um ator indispensável para a conservação da vida silvestre”.
Regina Horta Duarte – Perfil
Regina Horta Duarte é historiadora, professora e pesquisadora especializada em História do Brasil República, história e natureza, história da biologia e história dos animais. Graduada em História pela UFMG (1985), realizou mestrado e doutorado na Unicamp (1988 e 1993), atuou como professora titular livre da Universidade Federal de Minas Gerais, onde permanece como docente permanente do Programa de Pós-Graduação em História e coordena o Centro de Estudos dos Animais (CEA). Desde 2025, é professora visitante da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
É autora dos livros A Imagem Rebelde (1991), Noites Circenses (1995), História e Natureza (2005), A Biologia Militante (2009). Activist Biology (2016). e Genealogia dos Zoológicos na América Latina (2025), além de artigos em revistas acadêmicas nacionais e internacionais.
Pioneira na história ambiental e na história dos animais na América Latina, Regina participou da fundação da Sociedade Latino-Americana y Caribeña de História Ambiental (SOLCHA), da qual é membro permanente da Junta Diretiva de ex-presidentes. Foi editora-chefe de importantes revistas da área — como a Revista Brasileira de História, HALAC e Varia História — e hoje dedica-se especialmente ao estudo histórico dos zoológicos latino-americanos no século XX. É autora de livros e artigos de referência, além de criadora do canal educativo “As 4 Estações”, voltado à divulgação da história ambiental.
Defensora da coexistência entre espécies e estudiosa das relações entre humanos e fauna, cultiva um profundo interesse por gorilas, aves, aracnídeos, lobos-guará, polvos e animais silvestres em geral, sempre orientada por uma perspectiva evolucionista-Darwinista e, ao mesmo tempo, ambientalmente engajada.
A coleção “BH. A Cidade de Cada Um”
Desde setembro de 2004, a coleção “BH. A cidade de cada um”, idealizada pelos jornalistas José Eduardo Gonçalves e Sílvia Rubião, vem construindo a memória afetiva da cidade por meio de textos literários escritos por pessoas de diversas gerações, escolhidas por sua grande identificação com os temas trabalhados. Publicada pela Conceito Editorial, a série tem como ponto de partida suas vivências pessoais dos autores, nas quais eles relatam sobre bairros, lugares, fatos e personagens diversos, sem o compromisso de se prenderem à história oficial, gerando grande empatia entre moradores e admiradores da capital mineira.
Lançamento do livro “Zoológico – BH. A Cidade de Cada Um”
Com sessão de autógrafos de Regina Horta Duarte
Quando. 13/12/25 (sábado), das 11h às 14h
Onde. Livraria Jenipapo (rua Fernandes Tourinho, 241, Savassi)
Quanto. Entrada gratuita




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