Galeria Errol Flynn – Belo Horizonte
30 de outubro de 2025 a 26 de janeiro de 2026
Galeria Errol Flynn apresenta, a partir de 30 de outubro, a exposição Antônio Poteiro: 100 anos, com curadoria de Errol Flynn Jr., reunindo mais de 100 obras entre pinturas, cerâmicas e raros painéis que celebram o centenário de nascimento de um dos nomes mais singulares da arte brasileira.
A mostra possui, em grande parte, obras pertencentes ao acervo da galeria, além de peças provenientes de coleções privadas, com foco nas décadas de 1970, 1980 — período de maturidade e plenitude criativa do artista — e 1990.
Nascido em Portugal em 1925 e radicado ainda criança no Brasil, Antônio Poteiro (1925–2010) construiu sua trajetória entre Minas Gerais e Goiás, territórios que marcaram profundamente sua linguagem visual. Em Minas, viveu seus primeiros contatos com o imaginário popular e o ofício ceramista; em Goiás, encontrou o solo simbólico onde sua arte floresceu, integrando religiosidade, vida cotidiana e mitos rurais.
Segundo Marcus de Lontra Costa, “Poteiro é um artista que brota da terra — sua obra é feita de barro, cor e memória. Em suas cerâmicas e pinturas, o gesto do fazer se transforma em linguagem, num diálogo entre o sagrado e o humano que transcende fronteiras geográficas ou estilísticas.” A exposição propõe um olhar sobre Poteiro como um mediador entre tempos e culturas, cuja obra ultrapassa o campo da arte popular para afirmar-se como reflexão universal sobre a existência e o pertencimento.
“A motivação desta mostra é a junção entre o reconhecimento que eu e o Junior, meu irmão, temos pela poderosa e encantadora simplicidade da obra de Poteiro, e o reconhecimento de grande parte do mercado e da crítica desde seu surgimento na arte brasileira, por influência da folclorista Regina Lacerda e do artista Siron Franco.” — Leonardo Reis, diretor da Errol Flynn Galeria de Arte
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Entre as pinturas expostas, Ceia do Coronel (1976, óleo sobre tela, 73 x 92 cm) revela a dimensão social e simbólica da obra de Poteiro. A cena — ao mesmo tempo festiva e crítica — transforma o banquete em uma alegoria da desigualdade e da hierarquia, em que o sagrado é reelaborado à luz do cotidiano sertanejo.
Em Homem e a Tartaruga (1979, óleo sobre aglomerado, 46 x 52 cm), o artista transfigura o mito em fábula. O homem e o animal, figuras de tempos distintos, parecem partilhar a mesma paciência e destino, como se o ritmo do mundo dependesse da lentidão da terra.
Já em O Mundo (1982, óleo sobre tela, 70 x 60 cm), Poteiro cria uma cosmogonia própria. O planeta surge não como globo científico, mas como corpo pulsante — território de mistérios e crenças, habitado por seres que flutuam entre o humano e o divino.
A cerâmica Pote Ciranda (1976, cerâmica pintada, 49 x 28 cm) dá forma tridimensional a essa cosmologia. A roda de figuras que se entrelaçam remete aos ciclos da vida e à dança do tempo. É uma escultura que respira — viva, porosa, feita de gestos e vozes da terra.
Sério e Sábio por Olívio Tavares de Araújo
1,13 obra para cada ano de vida do artista. Há bom tempo percebo a admiração e o carinho dos irmãos Flynn, não só como marchands mas também como pessoas, em suas sensibilidade individuais, pela arte de Antônio Poteiro, cujo centenário de nascimento esta exposição comemora. Com o mesmo afeto foram procurando e reunindo pinturas e cerâmicas, guardando-as para o evento de hoje. Creio que acervo com o mesmo porte e brilho só deve existir em Goiânia, nas coleções da família e do Instituto Antônio Poteiro. Cabe realçar ainda que a exposição dá a devida importância à produção em cerâmica, àqueles grandes potes de barro que eram sua profissão original e lhe deram seu nome artístico. Da função utilitária, os potes se alçaram a objetos estéticos graças à profusa ornamentação e ao peso, que os privou do uso origina, e se desdobraram em esculturas. Só servem hoje para serem contemplados. Isto é: servem para muito mais.
Para esse tipo de artista que de repente emerge dos recantos onde se escondia, não fez estudos específicos, não aprendeu a desenhar nem a pintar – para depois ter reconhecido o direito de violar os cânones correntes -, e não veio caminhando ao longo de um processo balizado pela Alta Cultura, usam-se, como sabemos, os rótulos primitivo e ingênuo, este traduzindo o francês naïf, usado na Europa. Nenhum dos dois me agrada, porque podem conotar ideias de primitividade, rudimentarismo, precariedade técnica ou intelectual. Mas basta ver a esperteza da pintura e da pessoa de Poteiro – nos dois sentidos da palavra: expertise – para darmo-nos conta de sua suficiência e eficácia expressivas, nada menos ingênuo que ele. O mais correto é chamá-lo de espontâneo e/ou popular, títulos que entre os civilizados não diminuem ninguém. Primitivo Poteiro não é.
Como pintor, Poteiro foi descoberto, podemos até dizer viabilizado, por Siron Franco no começo dos anos 1970, década da mais intensa atividade na arte brasileira. Observando a riqueza formal da ornamentação dos potes, a fabulação rica e movimentada, a fervente invenção, Siron teve a ideia de lhe colocar nas mãos tintas, telas e pinceis, e fosse o que Deus quisesse. Deus quis. A força do pintor emergente lhe valeu sucesso imediato de público e de crítica, e em 1978 ele estava expondo na Galeria Bonino, no Rio, aval certo de reconhecimento e qualidade. Daí em diante expôs no Brasil e no exterior, em todas as coletivas internacionais da nossa arte contemporânea, e em numerosas individuais. Encontrei-o uma vez no Japão acompanhando uma destas, arranjando-se perfeitamente sem saber uma palavra em qualquer língua estrangeira, e passando muito bem, obrigado. Com maior desenvoltura (se possível) enfrentou e resolveu os desafios da criação.
Exposição: Antônio Poteiro: 100 anos
Curadoria: Errol Flynn Jr.
Textos críticos: Marcus de Lontra Costa, Denise Mattar e Olívio Tavares de Araújo
Abertura: Quinta-feira, 30 de outubro de 2025, às 19h30
Conversa sobre o artista com Olívio Tavares de Araújo
Período expositivo: 30 de outubro de 2025 a 26 de janeiro de 2026
Local: Galeria Errol Flynn – Rua Curitiba, 1862, Lourdes, Belo Horizonte
Visitação: Segunda a sexta-feira, das 9h às 18h | Sábados, das 10h às 13h | Entrada gratuita




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