Primeiro álbum de samba do artista mineiro reúne músicas que passeiam por outras várias influências afro-brasileiras; shows no interior acontecem em dois redutos quilombolas, nos dias 14/6, em Antônio Dias, e 21/6, em Santa Maria de Itabira
Um dos principais representantes da música afro-mineira, o cantor, compositor e multi-instrumentista Sérgio Pererê transita por universos infinitos quando o assunto é música: do dos tambores de matriz africana às flautas; do Carnaval ao cancioneiro apaixonado. Com quase 30 anos de carreira, e uma extensa bagagem fonográfica, Pererê se dedica agora pela primeira vez ao gênero musical que reflete a alma do brasileiro, como ele mesmo define o disco “Samba de Preto Velho”.
Depois do lançamento em Belo Horizonte, em dezembro do ano passado, o show do primeiro álbum dedicado ao samba de Pererê desembarca em outras cidades, em um momento especial para o artista. Recém-chegado de uma viagem à África, onde visitou a Guiné Bissau numa busca por ancestralidade, Pererê aproveita o momento para realizar os próximos shows do novo disco em redutos quilombolas mineiros.
O primeiro deles acontece no dia 14/6 (sábado), no Quilombo Indaiá, localizado na cidade de Antônio Dias, no Vale do Aço. A comunidade quilombola tem uma história de mais de 200 anos de tradição, mas há apenas 50 anos iniciou os contatos mais frequentes com as áreas urbanas da cidade. Antes do show, o público poderá prestigiar a Feira de Produtos Quilombolas, a partir das 14h. A comunidade ainda fará sua festa junina, com apresentação de quadrilha e barraquinha com comidas típicas.
Já a segunda apresentação será no sábado seguinte, dia 21/6, no Quilombo Barro Preto, em Santa Maria de Itabira, durante a tradicional Festa de Santo Antônio. O quilombo tem sua ocupação registrada no início do século XIX e, de lá para cá, resistiu a muitas tentativas de silenciamento para preservar a cultura negra.
“Eu estou fazendo esses shows pouco tempo depois de voltar do continente africano e com uma memória muito forte da África na cabeça. É um show que vai ter a energia de várias expressões da arte afro-brasileira, e não apenas o samba. Com certeza, isso vai ao encontro desses lugares que têm presença quilombola muito forte. Vamos trazer a energia quilombola para o show, misturado com a força popular do samba”, diz Pererê.
Samba afro-mineiro
Em “Samba de Preto Velho”, Pererê apresenta 12 composições próprias, algumas escritas há mais de dez anos, mas todas baseadas em ramificações do samba. As músicas seguem as toadas do ijexá, do samba de gafieira e do partido alto, por exemplo, mas carregam também raízes da música afro-brasileira, essência primária de Pererê, como as células rítmicas do candomblé, da umbanda, do maracatu, do jongo e do calango.
A direção musical é do multi-artista Acauã Rane que, além de produtor, compositor e arranjador, levou para o disco sua vivência como alabê — sacerdote responsável pela música nos rituais de candomblé. “O Acauã foi mais do que um produtor musical. Ele convocou o grupo de músicos, dirigiu as gravações, criou os arranjos. Fiz uma gravação de todas as músicas com o cavaquinho para ele conhecer e, a partir daí, o Acauã criou os belos arranjos do disco”, conta Pererê.
De fato, os arranjos de “Samba de Preto Velho” brilham com força, fazendo jus às gravações clássicas de bambas do gênero. Não por acaso, “Brilho Perfeito”, segunda faixa do disco, é um samba de gafieira arranjado com belas flautas, e influenciado pela escola clássica de Zeca Pagodinho. Já “Estrela Guia”, que abre o álbum, traz um ijexá que remete à atmosfera dos sambas de Gilberto Gil.
Por outro lado, “Canto do Teimoso” insere no samba uma das características mais marcantes de Pererê: os cânticos declamados à capela, quase como orações (“a minha fé vem lá do fundo do mar / foi de pedra em pedra que fiz meu caminho do lado de cá”). Já a canção “Xapanã” estreita ainda mais os laços simbólicos do trabalho junto ao universo do candomblé, prestando homenagem a Omolu, orixá da doença e da curas, da terra e do sol.
A sonoridade do disco ganha corpo com a presença de craques do samba, como Daniel Guedes (pandeiro e efeitos), Rodrigo Martins (surdo, tantan, efeitos e coro), Rudney Carvalho (in memorian, cavaco), Rafael Di Souza (violão, guitarra e coro) e Marcos Frederico (bandolim). Completam a banda Acauã Rane, responsável pelo baixo e pelos coros, e Ney Corrêa (bateria).
Um dos pontos altos do álbum são as participações de Fran Januário e Vivi Amaral, duas das principais intérpretes das rodas de samba de Belo Horizonte, idealizadoras do projeto “Samba de Origem”, que valoriza o protagonismo da mulher negra no samba. Elas dividem a faixa “Mais Samba e Menos Lágrimas” com Pererê, em um refrão contagiante: “de tanto jogar flores no mar / acho que mereço amor / com as bênçãos de Iemanjá”.
“Samba de Preto Velho” foi gravado ao vivo, em maio de 2021, no Teatro do Centro Cultural Minas Tênis Clube, em Belo Horizonte, durante a pandemia, sem a presença do público. A mixagem e a masterização ficaram por conta de André Cabelo, do Estúdio Engenho.
Discografia a pleno vapor
Mantendo uma produção de alto nível, “Samba de Preto Velho” é o quarto disco de Sérgio Pererê lançado apenas em 2024. O trabalho sucede “Canções de Outono” (Natura Musical), primeiro álbum do mineiro dedicado às modas de sofrência e gravado junto a 14 cantoras, incluindo Mônica Salmaso, Fernanda Takai e Letrux.
Ainda no ano passado, o multiartista mineiro lançou “Sérgio Pererê e Bloco Oficina Tambolelê”, que celebra os 25 anos do Tambolelê, um dos precursores dos blocos afro em Minas Gerais, conhecido por desenvolver ritmos próprios; e “Bentu”, gravado com a cantora e violonista paulista Badi Assad — um dos principais nomes do violão brasileiro contemporâneo.
Agora, com pique de sobra para criar sua própria roda em mais um projeto inédito, é a vez do samba. “Acredito que todo cantor e compositor brasileiro precisa passar pelo samba. O samba esteve presente na minha vida e na minha história, de modo que, houve uma época, na minha infância, que eu não entendi o samba como gênero musical, mas como um estado de consciência e de espírito. E até hoje é assim. Ou seja, o samba é, de fato, a alma do povo brasileiro. Por isso, é preciso conhecê-lo”, avalia Pererê.
CEMIG: A energia da cultura
O projeto tem patrocínio da CEMIG, via Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais. Como a maior incentivadora da cultura em Minas Gerais, a Cemig segue investindo e apoiando as diferentes produções artísticas existentes nas várias regiões do estado. Afinal, fortalecer e impulsionar o setor cultural mineiro é um compromisso da Companhia, refletindo seu propósito de transformar vidas com energia.
Ao abraçar a cultura em toda a sua diversidade, a Cemig potencializa, ao mesmo tempo que preserva, a memória e a identidade do povo mineiro. Assim, os projetos incentivados pela empresa trazem na essência a importância da tradição e do resgate da história, sem, contudo, deixar de lado a presença da inovação. Apoiar iniciativas como essa reforça a atuação da Cemig em ampliar, no estado, o acesso às práticas culturais e em buscar uma maior democratização dos seus incentivos.
Shows do disco “Samba de Preto Velho”, de Sérgio Pererê
Quilombo Indaiá (Antônio Dias-MG)
14/6, sábado, 19h, na Praça da Igreja, após a Feira de Produtos Quilombolas
Quilombo Barro Preto (Santa Maria de Itabira-MG)
21/6 (sábado), às 19h, no Campo de Futebol, durante a Festa de Santo Antônio
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